Pesquisa mostra que Fundão eleitoral promove disparidades entre candidatos

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Pesquisa do Instituto Millenium aponta que o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, também chamada de Fundão Eleitoral, não está conseguido democratizar o acesso a recursos nas eleições. Pelo contrário, a pesquisa apontou que ele estaria contribuindo para perpetuar as disparidades de gênero, raça e classe social. O site Café com Informação entrevistou Wagner Vargas, cientista político e um dos autores do Estudo e especialista do Instituto Millenium sobre a pesquisa.

Site Café com Informação: Gostaria que comentasse um pouco sobre a pesquisa e o que foi apurado?

Wagner Vargas: A análise sobre o Fundo Eleitoral tem sido conduzida ao longo de vários ciclos eleitorais, incluindo 2020, 2022 e agora 2024. Seu objetivo é verificar se o Fundo está cumprindo sua proposta de democratizar o acesso às campanhas políticas. No entanto, os dados indicam que, ao contrário dessa intenção, o Fundo está concentrando receitas em candidatos mais ricos, estabelecidos e com maior capital político. O problema central é que a promessa de equidade não se cumpre na prática, pois os candidatos com mais patrimônio continuam sendo os maiores beneficiados, enquanto os de menor patrimônio recebem valores muito menores.

Wagner Vargas crédito da foto: Divulgação

SCI: Quais as diferenças observadas nas últimas eleições apontadas pela análise em relação ao Fundo Eleitoral?

WV: As diferenças observadas nas últimas eleições, incluindo 2024, mostram que a concentração de recursos em candidatos ricos e homens persiste. Candidatos com patrimônio superior a R$ 1,2 milhão receberam 25,2% dos recursos, embora representem uma parcela mínima dos concorrentes. Por outro lado, candidatos com patrimônio mais baixo, que formam a maioria, receberam uma fração ínfima dos recursos. Isso perpetua desigualdades que o Fundo deveria combater. Nas eleições anteriores, a tendência era a mesma, indicando que o modelo não está conseguindo cumprir sua função democratizadora.

SCI: De que modo as candidaturas no Nordeste estão sendo afetadas por esta atual estrutura de distribuição da verba do Fundo?

WV: As candidaturas no Nordeste seguem o padrão de concentração de recursos observado em outras regiões. O montante total destinado à região foi de R$ 1.412.848.477,53, mas a distribuição interna favorece aqueles candidatos que já têm maior poder ou capital político, especialmente os mais ricos. Essa estrutura reforça as desigualdades regionais, uma vez que candidatos com menor patrimônio ou menor visibilidade enfrentam dificuldades para acessar uma parte significativa do fundo. Esse cenário reforça a necessidade de uma revisão no modelo de distribuição dos recursos.

SCI: A situação afeta a independência do pleito eleitoral? Ou seja, haveria uma espécie de “seleção” de privilégios para candidatos?

WV: Sim, os dados indicam que, apesar de a política de quotas obrigatórias ter levado a um aumento de candidaturas de mulheres e de outras etnias, os recursos continuam sendo concentrados em candidatos homens e brancos. Isso sugere que o Fundo Eleitoral está, de fato, reproduzindo desigualdades em vez de corrigi-las. A obrigatoriedade das quotas parece não impedir o desvio de recursos para candidatos fora dos grupos beneficiados, o que indica que, em alguns casos, as candidaturas podem ser usadas para drenar recursos de forma indevida. Além disso, o modelo como um todo favorece aqueles que já têm maior chance de vencer, o que pode impactar a independência e a diversidade do pleito eleitoral.

SCI: O que pode ser feito para mudar esse cenário?

WV: É necessário questionar o modelo do Fundo Eleitoral em sua totalidade. A atual estrutura de financiamento público não está democratizando o acesso às campanhas políticas de forma efetiva. Reformas profundas são necessárias para garantir que o fundo cumpra seu objetivo de promover equidade. Além disso, é fundamental avaliar a eficácia do Fundo como uma política pública. Em um país com tantas demandas sociais urgentes, o financiamento de campanhas deveria ser revisado, e a alocação de recursos públicos deveria ser focada em áreas prioritárias. Também é essencial melhorar a fiscalização e criar mecanismos que assegurem uma distribuição mais justa dos recursos, não apenas baseada em quotas, mas em critérios que garantam que os recursos sejam direcionados para os candidatos que realmente necessitam.

Foto: Fábio Pozzebom/Agência Brasil

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