O Caderno do Gás da EPE

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Adary Oliveira- ex-presidente da Associação Comercial da Bahia


A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão do Ministério de Minas e Energia (MME), dentro dos Estudos do Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2034, publicou recentemente o Caderno do Gás Natural com o objetivo de elucidar e disseminar as principais informações sobre as perspectivas do setor de gás natural em relação aos seus diversos aspectos, no horizonte de 2024 a 2034. O documento analisa a infraestrutura de gás natural existente e projetada contemplando o preço, a oferta, a demanda, o balanço oferta – demanda, incluindo também simulações, apreciação dos investimentos e perspectivas futuras.

Apesar de ser bem elaborado apresentando dados estatísticos e gráficos que ilustram e auxiliam o entendimento, deixou de lado algumas questões consideradas fundamentais e que precisam ser encaradas de frente pelo governo.
Um dos assuntos é a ausência de citação do Preço de Referência (PR) que tem sido objeto de discussão pelo mercado. O PR é calculado pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e serve para cálculo dos royalties pagos pelos produtores de gás à União, Estados, Municípios e proprietários de terra. Analistas afirmam que ele está abaixo da cotação do mercado e tem causado prejuízos enormes aos que são remunerados pela produção do gás natural.

Também ficou fora do caderno as discussões sobre a exploração do gás não convencional por fraturamento hidráulico, que viria a baratear o preço do gás natural como aconteceu em muitos países como nos Estados Unidos, Canadá, China e Argentina. Os órgãos de meio ambiente são contrários e o MME já se manifestou favoravelmente.

Outra questão que também não foi avaliada pelo caderno é o do alto volume de reinjeção praticado pelas empresas que exploram o petróleo e gás no pré-sal. Afirma-se que a reinjeção aumenta a produção de petróleo e as petroleiras preferem essa prática por proporcional melhores resultados financeiros, restringindo a oferta de gás ao mercado.

A adoção de uma política de preços para o gás que beneficie a indústria química nacional, como a de preço diferenciado do gás matéria prima versus gás usado na geração de energia (calor ou eletricidade). O preço elevado para o gás matéria prima tem provocado o fechamento de fábricas e o aumento das importações, desempregando brasileiros e onerando a balança de pagamentos.

Apesar de fazer referência ao suprimento de gás para as fabricas de fertilizantes nitrogenados Fafen-MS e Fafen-PR, não menciona as Fafens BA e SE que estão paralisadas devido peço elevado do gás. Essas unidades são de propriedade da Petrobras e estão arrendadas à Unigel.

Outro assunto que ficou faltando nas discussões é o da prática da compra de gás pelo consumidor livre, principalmente agora que a Bolívia irá ofertar mais gás ao Brasil por ter a Argentina deixado de importar gás daquele país. O gás atualmente importado da Bolívia custa pouco mais de US$ 6,00/MMBTU EXW em Mutún, mais em conta que o vendido no Brasil à indústria e às companhias distribuidoras, por US$ 14,00 /MMBTU.

Merece também atenção do governo a prática de estocagem subterrânea de gás, como forma de balancear a oferta. A antecipação governamental a questões que poderiam vir, principalmente de natureza fiscal, evitaria discussões sobre o assunto no futuro. Esse assunto não foi encontrado nas páginas do caderno.
Em relação aos investimentos, merecia alguma atenção a construção do gasoduto Uruguaiana – Porto Alegre para recebimento do gás argentino de Vaca Muerta por um caminho mais curto do que o passando pela Bolívia. Isso solucionaria o problema de abastecimento de gás do Polo Petroquímico de Triunfo, hoje mal atendido pelo Gasbol.

Os oito pontos aqui levantados não esgotam o assunto, mas expõem alguns dos problemas que a indústria nacional enfrenta pela necessidade que temos de aperfeiçoar nossa política do abastecimento do gás natural. Todo esforço nesse sentido deve ser bem-vindo, por aumentar a geração de energia limpa e reduzir práticas de consumo indesejáveis, como o consumo elevado de lenha e outros materiais usados como como combustível.

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