Priscila Planelis – Advogada e Secretária-Executiva da Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES)
Se o Brasil deseja ampliar a escolarização em nível superior, como prevê o texto do Plano Nacional de Educação em discussão na Câmara dos Deputados, é preciso enfrentar o problema pela raiz: garantir condições para que o estudante permaneça estudando e para que a instituição consiga manter sua oferta com qualidade.
O novo relatório de inadimplência no ensino superior privado, divulgado pelo Instituto Semesp, confirma uma realidade que as instituições já vinham percebendo na prática: embora tenha havido uma leve redução da inadimplência nos cursos presenciais no primeiro semestre de 2025, o cenário permanece desafiador. As famílias continuam enfrentando dificuldades para manter o pagamento regular das mensalidades, o que pressiona diretamente a sustentabilidade das instituições de ensino superior. Segundo o estudo, a inadimplência total alcançou 8,73% no período, uma queda de 1,9% em relação ao ano anterior, um avanço tímido frente ao tamanho do problema.
O levantamento também revela movimentos distintos entre as modalidades. Nos cursos presenciais, a inadimplência recuou 3,1%. Já no ensino a distância, houve crescimento de 8,4%, indicando que a modalidade que mais ampliou o acesso ao ensino superior nos últimos anos, conforme dados do Censo da Educação Superior divulgados recentemente pelo INEP, agora enfrenta uma tendência de fragilização no que tange à permanência. Esse cenário exige atenção do setor, do poder público e da sociedade.
Os dados revelam uma questão estrutural: questão estrutural: as instituições de pequeno porte são as mais impactadas, com taxa de inadimplência de 12,67%, significativamente acima da média nacional. Essas instituições, que atendem até 3 mil alunos, estão localizadas majoritariamente no interior e em cidades médias, onde são, muitas vezes, a única opção de acesso ao ensino superior na região.
Ou seja: estão sob maior risco justamente as instituições que garantem a presença da universidade onde ela não chegaria por mercado ou escala. São essas instituições que formam professores para a educação básica, enfermeiros que atuarão na rede pública, contadores, gestores municipais e profissionais que permanecerão em suas comunidades e movimentarão economias locais.
Quando uma instituição pequena enfrenta grave problema de inadimplência, corre o risco de fechar ou reduzir a oferta de cursos. Perde-se empregabilidade, inovação, circulação de renda, permanência dos jovens em suas cidades e capacidade de desenvolvimento regional. A cidade inteira perde.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é clara ao estabelecer, no artigo 7º, inciso III, que as instituições de ensino superior devem assegurar a condição de autofinanciamento, o que pressupõe sustentabilidade econômico-financeira compatível com a manutenção e a melhoria contínua de seus cursos. A inadimplência, portanto, não pode ser tratada como um problema privado de gestão. Ela é uma questão de interesse público.
A inadimplência no ensino superior é, portanto, uma questão social, territorial e estratégica para o país. Defender a sustentabilidade dessas instituições é defender o direito de milhares de jovens de permanecerem em suas cidades e construírem seus próprios projetos de vida. E isso diz respeito a todos nós.
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